segunda-feira, 10 de agosto de 2009

LAPA, O RETORNO

Escutei fogos espocando no Vale. As montanhas ecoavam e o som se reproduzia cada vez mais baixo, de uma parede para outra, da Serra da Larguinha para a Serra do Candombá, saindo da Rua indo pra Serra da Moitinha. Mas antes que morresse o barulho outros mais e mais outros e muito mais. No início lembrei que podia ser mulher parindo, hábito velho por aqui: Uma vez nascida a criança, fogos estouram. Mas, primeiro, não tinha ninguém esperando para agora, e em segundo lugar, muito barulho pra um parto. Guardei pra perguntar.
Foi só no dia seguinte que me disseram que chegou o povo da Lapa. Todos os anos vai muita gente em romaria para aquele santuário. E cada ano mais. Não mais como antigamente quando se ia a pé e não era pouca a demora; hoje o povo vai de ônibus. É bom saber que a gente daqui agora tem condições de ir em melhor situação. E como gostam! Afora a devoção, tem a alegria de sair do cotidiano, correr o mundo, passear, faltar com as responsabilidades, que são muitas, que são, em alguns casos, opressivas. Como têm a desculpa da fé, muitas senhoras (e, claro, senhores também), conseguem ausentar-se de seus lares e têm o refresco deste longo passeio, repleto de prêmios em conversas divertidas, chistes típicos das viagens em grupo, comilança, cores e paisagens diferentes que preenchem os olhos, além das possíveis indulgências. Gosto de ver esta alegria. E depois é a contação de tudo o que aconteceu nos detalhes mais mínimos: Porque este passou mal em tal dia e aquele caiu da cadeira de tanto comer, e o passeio do outro lado do rio com tanto peixe? Não dá pra esquecer que tem muito ladrão e quatro velhinhas foram roubadas no meio da missa, sorte tiveram que os policiais viram, mas também não ouviram a recomendação de não andar com bolsas... Muitas histórias que preencherão as cozinhas e as salas de jantar até a próxima romaria.
A vida não foi brincadeira para a maior parte desta gente. Hoje jovens se estão incluindo nesta aventura e isso me agrada. Deve ser porque a par da religião a farra é grande, mas enfim, que bom vê-los partilhando com pais e avós. Oxalá fossem em maior número. Gostaria que os jovens do Vale do Capão tivessem a oportunidade de conhecer a vida que seus progenitores levaram. Nosso país não é muito bom para salvar a história. Muito se esquece. Pena. Muito se aprende quando a memória não é demasiadamente curta. Quero que convivam os velhos e os jovens e quero que se contem uns aos outros suas histórias (que, justiça seja feita, os rostos juvenis também têm o que dizer). Tenho tido a sorte de ser escutado pela juventude e conto com amigos cuja idade é um terço da minha. Embora meus filhos, nos momentos de brincadeira, digam que sou do tempo da televisão a vapor, parece que as histórias do tempo do vapor eram bem interessantes!
O legal é que o mundo gira, mas os problemas morais continuam, em essência, os mesmos.
Inté outro dia.

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