quarta-feira, 25 de novembro de 2009

DROGAS

DROGA
Vejam que coisa: Têm chegado alguns jovens aqui no Vale do Capão com uma característica. São viciados em drogas e os pais despacham para cá com a idéia de que, como aqui é um lugar tranqüilo, eles estarão em certa medida protegidos. Também afastam o problema para bem longe deles. Longe dos pais, perto de quem não tem nada a ver com a história. Esta turma fica aqui sem fazer nada a não ser fumar maconha e estimular os adolescentes locais a fazer o mesmo. Assim, não só não melhoram de seus vícios como aumentam a incidência dos mesmos aqui no Capão. Incomodam os vizinhos e contribuem para que os filhos daqui percam seus rumos. E isso é unir o inútil ao desagradável.
Há algum tempo os donos de uma casa de materiais de construção foram acordados no meio da noite por um jovem desesperado. Sonolentos perguntaram o que desejava. O rapaz pedia uma lata de cola, pois precisava consertar algo. Mas era no meio da noite. Teriam que ir abrir a loja e seguramente tal conserto não era tão urgente assim. Para aquele viciado em cheirar cola, era. Não atenderam ao pedido e, depois, retiraram das prateleiras toda a cola que tinham. Felizmente este rapaz não suportou o Vale. Foi embora. Aliás, esta é uma sorte que temos: Conquanto tenhamos uma vida rica em atividades (circo, capoeira, teatro, pilates, dança etc.), nunca é tão cheia quanto na cidade grande; ademais, faz frio, chove mais do que em outros lugares, e, por fim, muitos acabam contraindo enfermidades por falta de cuidados de higiene, o que os leva a buscar o litoral, quente, ensolarado, com facilidade de transporte e muitas “baladas”.
Nós não temos aqui uma incidência de viciados como nas cidades grandes. Mas temos usuários. Alguns jovens nativos me causam uma certa tristeza quando os vejo. Há aqueles que de quando em vez fumam maconha, aliás, esta erva chegou no Capão muito antes da sua descoberta pelos citadinos de outras paragens. Sabe-se que alguns dos idosos de quando em vez a utilizavam. Porém existem alguns rapazes (e moças, porém bem menos) que estão se afastando de trabalho e escola, permanecendo naquela modorra aflita e incapacitante. Coloquei há pouco a palavra aflita porque, embora aparentem total tranqüilidade com o que fazem – manifestam até um certo orgulho por sua pseudo-opção, como se fizessem parte de uma elite – todos são muito tensos como verifico nas vezes em que fazem consulta no posto. Há uma insatisfação impregnada em seus corpos. Eles não querem trabalhar seguindo o exemplo dos seus pais, até porque viram os mais velhos labutarem tenazmente por exígua recompensa. A vida do camponês não é nem um pouco romântica. Seus pais laboraram arduamente e sempre com grande dificuldade, daí os jovens não se entusiasmam muito em seguir-lhes o rumo. Porém nem sempre encontram uma alternativa realista à fantasia de viver como “os de fora” sustentados pelos pais.
Temos exemplos, como Lili, um jovem empreendedor que produz de tudo em sua horta e pomar, já tem quitanda e caminhão. Isso conseguido com luta e uma visão de economia superior a de seus pais. Nininho é outro que começou como guia, estudou, foi presidente da associação dos moradores onde se destacou e hoje é vereador (um dos poucos coerentes). A tristeza é que nem todos os jovens percebem que o caminho escolhido por estes dois (e outros) é mais seguro do que a fantasia de viver no país dos Lotófagos (na Ilíada Ulisses chega neste país onde quem come uma certa folha esquece de tudo).
O álcool ainda permanece sendo a grande droga dos lugares pequenos, mas segundo informações obtidas nos inúmeros contatos que tenho com pessoas de outras cidadezinhas das redondezas, maconha, cola e mesmo cocaína e crack estão avançando. Há um lugarejo na estrada para Irecê onde a incidência é chocante. Como não temos um policiamento adequado os traficantes ficam mais livres para agir. Se nas grandes cidades já é difícil o controle, imagine no sertão.
Por isso sou tão insistente defensor da instalação de uma sub-delegacia de polícia no Vale do Capão. Claro que não penso que polícia resolve o problema. Afinal, o problema não é de polícia. Passa por inúmeras questões que vão desde a criação dos pais, relacionamento pais/filhos, expectativas sociais, problemas pessoais, dificuldades no próprio processo de crescimento somato-psíquico, necessidade de transcendência etc. etc. etc. É muita coisa. Mas a polícia pode coibir certas condutas como a que descrevo agora:
Um cara bateu em uma porta de uma pessoa nativa, foi atendido por uma criança e pediu fósforo. A garota entrou e trouxe o fósforo, o cara acendeu um baseado e em seguida ofereceu-o à criança. Por sorte a mãe chegou na hora e fez um escândalo. Às vezes falta um mínimo de bom senso.
Talvez este texto traga a idéia de que as drogas invadiram o vale. Invadiram. Mas não significa que a cada passo você encontra alguém usando-as. Não é assim. Não se trata de que a vida está ficando intratável ou impossível. Porém, aqueles que temos bom senso, estamos preocupados.
Recebam um abraço,
Aureo Augusto.

2 comentários:

  1. Caro, Dr. Áureo.

    Eu poderia colocar o meu vilarejo dentro do Capão, tal a situação tão idêntica de ambos lugares.

    Lugares lindos, peturbadoramente lindos (claro que o Capão, bem mais), de pessoas mansas e tranquilas mas INVADIDOS pela maconha, coca, crack, álcool, etc e tal.

    Triste e despesperador.

    Meu Deus, aonde vamos parar? Aonde estes jovens querem chegar?

    Minha raiva maior vem à tona, qdo eu vejo artistas, músicos, atores que, como formadores de opiniões e de cabeças, assumem com a cara mais descarada do mundo que usam drogas.

    Então eles passam a imagem que a droga traz liberdade e vida boa.

    Eu tenho dito que a droga é o câncer dos tempos atuais.

    Eu nutro o mesmo sentimento que o senhor, ao ver tantos jovens sendo tragados pelo vício.

    Tenho visto nativos (do meu vilarejo) que antes viviam em minha casa, alimentado por mim, acolhido por mim, envolvido com o tráfico.

    É desperador. Eu sinto medo, angústia e pena qdo eu vejo tantos jovens indo pelo viés da droga. Um caminho sem volta, muitas vezes.

    Lá tb falta policiamento, políticas públicas e não tem nenhuma ação social, como o Capão tem.

    Apenas um ali ou outro acolá, tentando ajudar, conversar.

    Sou muito de acolher. Já criei um menino, que hoje está com 28 anos, universitário, gerente de empresa, com seu próprio apartamento. Um rapaz maravilhoso e atualmente estou acolhendo um afilhado que sendo filho de pescador nada tinha a vislumbrar. Tb um bom rapaz e com fé em Deus, vai conseguir um futuro melhor. Além deles, tenho dois filhos, dois rapazes maravilhosos.

    Vixe maria.........eta criatura para escrever ...rs rs.

    Um grande abraço e muita luz.

    Jussiara

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  2. O problema é geral. Não tem mais um lugar que se salve.
    Mas vale conversar, falar, lutar, dizer...
    Um grande abraço,
    Aureo Augusto

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