Ocorre que a equipe da Unidade de Saúde lá do Vale do Capão
(Caeté-Açú) onde trabalho percebeu que necessitamos muito deste equipamento. Primeiro
pensei em eu mesmo ter um e facilitar a vida do povo fazendo ultrassom (USG) no
Vale para que o povo não precise se deslocar para Seabra, por uma estrada (pelo
menos sua 1ª parte) terrível, enfrentando depois uma longa espera. Além de ter
que pagar, com frequência, e valores mais caros dos que aqueles praticados em
Salvador. Depois pensamos que talvez pudéssemos conseguir um aparelho para o
posto e nisso estamos. Antevemos algumas possibilidades, e torcemos para que dê
certo, se você, leitor souber de alguma coisa, conta pra nós. Lembre que o
posto não dispõe de recursos.
Mas se chega o aparelho, alguém tem que saber o usa-lo e
aqui estou eu, aprendendo feliz!
Ontem cheguei de viagem e no caminho me lembrei que havia
deixado o livro de anatomia em casa. Por sorte o meu laptop recusou-se a
funcionar e por isso, na hora que cheguei não consegui ler o e-mail de Marcelo,
amigo em cuja casa estou hospedado. Como era pouco mais de meio-dia, fui ao restaurante
Brisa comer. Lá chegando havia uma liquidação de livros excelentes, a preços
ridículos. Assim comprei 3 livros de anatomia excelentes e um deles já vai para
a nascente biblioteca científica do posto (aliás, doe livros bons – nada
de coisa ultrapassada que você quer se livrar – para nossa biblioteca). Então revi
que às vezes uma situação de impedimento – como o problema no laptop – pode ser
uma oportunidade legal de compensar uma falha – o esquecimento do livro de
anatomia.
Agora, no intervalo para o almoço do curso – partilhei a
mesa com um colega extremamente simpático que, com os demais, contavam suas
experiências nos postos de emergência de Salvador. Devo dizer que trabalhar no
interior é maravilhoso, diante do que escutei. Este colega contou uma experiência
que mostrou não apenas um exemplo dos riscos por que passam os médicos, como
sua competência no jogo de cintura que lhe salvou a vida.
Uma senhora chegou morta ao pronto socorro. Os familiares
estavam revoltados e, sem perceber que a mulher já falecera, ameaçavam os
funcionários com revólveres em punho, afinal tratava-se de uma família, por
assim dizer, “da pesada”. Quando o corpo deu entrada no serviço, o médico
percebeu o risco que todos os funcionários corriam e a enfermeira de pronto lhe
informou que a mulher estava morta. Diante da reação de revolta armada dos
familiares, num momento de súbita inspiração o médico olhou para a enfermeira e
disse que quem definia se a pessoa estava viva ou morta era ele. O que parecia
ser uma conduta de arrogância, uma espécie de “cala a boca, ponha-se no seu
lugar”, revelou-se a salvação de todos. Então tocou no pescoço e disse: Está
viva e ato contínuo começou os procedimentos de ressuscitação, inclusive
entubando o cadáver. A família assistia à distância os esforços inauditos da
equipe na tentativa de salvar à suposta doente, já morta. Depois de algum tempo
de esforços, o médico disse em voz baixa a uma colega que continuasse fingindo
e que depois fosse anunciar a perda. Então foi explicar à família os
procedimentos que estavam sendo realizados. A família sensibilizou-se com o
esforço e quando a médica, por fim, veio com a triste notícia, todos já estavam
“amaciados” e aceitaram com mais tranquilidade a morte da matriarca.
O médico conseguiu transformar uma situação vexatória em
vitoriosa para a equipe que agora (havia na mesa dois colegas que presenciaram
o fato) ri de uns momentos nos quais, com certeza na hora da confusão foram
extremamente tensos. Como bem disse o referido médico: “Temos que ter jogo de
cintura e levar a vida com graça”. E está coberto de razão.
Recebam um abraço grato de Aureo Augusto.
Xiiiiiii...coitada da enfermeira que confirmou o óbito. Ela vai ter que se mudar desse posto.
ResponderExcluirRealmente está uma loucura, quem precisa de atendimento emergencial pelo Sus-to. O zelador de nosso prédio, vem penando, com toda a sorte de problemas envolvendo intestinos, fígado e sabe mais o que. E a mãe da minha diarista, com uma úlcera perfurada, foi mandada de volta, com um simples buscopan na veia. Se não fosse "a não hora dela", já estava do outro lado.
Parabens. Certamente, como eu digo e repito, o Capão é sortudo demais. E agora tem até ultras.
Desejo-lhe boa sorte....
Oh!querida, ainda não tem ultras! Esperemos que venha a ter.
ResponderExcluirO SUS é uma coisa maravilhosa, no papel. Mas infelizmente não é implementado da maneira ideal. No entanto devo dizer que o que se faz já é maravilhoso.
Creio ademais que a população tem hábitos bem nocivos para a saúde, sem o saber. A educação e a comunicação para a saúde carecem de maior implementação, para que pessoas como a mãe de sua diarista não precisem ter uma úlcera.
bjs
Mas tb amigo, uma senhora com ulcera perfurada, ser mandada de volta, com um buscopan é demais. Né?
ResponderExcluirÉ, assim tá duro de aceitar...
ExcluirÉ bom saber das suas iniciativas, Áureo, pois está sempre com o pensamento voltado para o bem-estar da população do Capão. Teríamos um país maravilhoso se um décimo de nossos políticos tivessem essa mesma orientação.
ResponderExcluirA maioria das pessoas fala mal do SUS, e não lhes tiro a razão, temos que procurar sempre melhorar o que temos. Contudo, façamos uma comparação tranquila e desprovida de preconceitos: Como seria se nem desse serviço dispuséssemos?
Não é uma situação irreal, sempre procuramos comparar-nos com países da Europa, com o Japão ou com os EUA mas o mundo não se resume a isso. E nem se garante que, em países desse naipe, sempre se obtenha um atendimento médico-hospitalar conveniente. Nem no Japão é tudo flores de cerejeira.
Quanto ao incidente narrado, não se congratule tão cedo, Áureo, pois vejo que o Capão é uma região maravilhosa e pacífica, mas nada impede que coisas do tipo, aconteçam por aí. Sempre aprece gente de fora, né?
Abraço sem SUS-to.
É isso mesmo Tesco, sem o SUS não seria fácil para nossa gente. Lembro qdo eu cheguei aqui no Vale. Não era fácil conseguir exames. Hoje está tudo mais fácil. Como vc disse, não é perfeito. Porém é questão de melhorar.
ExcluirNo ano passado uma francesa e seu namorado quase me agridem no posto pq eu não quis atendê-los, mesmo sabendo que não era urgência, que não tinham direito por não serem brasileiros. Um argentino que atendi pq estava mal de saúde e ficamos compadecidos da situação me insultou asperamente pq eu não dispunha de medicações para ele. Sim, sempre vêm pessoas de fora...
abraço.