quarta-feira, 28 de março de 2012

CADÊ A CHUVA?

Só se conversa do tempo. Ninguém escapa, muito menos eu. Até onde me vai a memória e a memória de outros tantos que por aqui vivem, nunca o tempo se ressecou como agora. Memória é coisa curta, pode até que lá pelos idos de 1930, quando os americanos amargavam a recessão, nós aqui experimentamos uma das maiores secas de que se tem notícia. Pode ser que naquele entonces a coisa tenha sido pior, não sei, não vivia pra saber. Sei que já tem um bom tempo sem chuva. Sei que em Seabra o rio da Pratinha, que nutre a cidade, cortou; em Andaraí a coisa está feia, do mesmo em Mucugê. Há duas noites de quando em vez despertei com gritos que começavam em um canto e respondiam em outro, também no meio da noite um clarão enorme entrou pela janela e frestas das telhas. Acordei e no lusco-fusco da consciência semi dormida, pensei que a luz do poste estava mais forte, refletia nos vidros e entrava pelo telhado como goteira. Escutei uns estalidos, sorri pensando gotas esparsas nas telhas e dormi. Só quando cheguei no trabalho que o pessoal me perguntou se eu ficara assustado com o incêndio na serra do Candombá, no fundo de minha casa, quase. Aí descobri o significado de clarões e estalidos. Saí a ver o rasgo escuro na serra verde. Ainda umas labaredas lambiam as pedras.

Foi incêndio feio, não escutei. Sono pesado. Só um detalhe das agonias que comentamos: poeira, nariz ardendo, ressecamento em tudo, chão encharcado de pó, tanto de deslizar as rodas dos carros e os pés embranquecerem no mergulho da poeira; crianças de chieira no peito, e adultos. Calor, suor seco, garganta ressentida, magoada, tosse, cansaço e canseira. Então, depois de muito arengar do clima todos levantam os olhos para o céu, esticam as vistas assuntando as nuvens se as há. Poucas, esparsas, fibras desconexas espalhando-se escassas. Às vezes gorgolejantes esperanças prendem-se a grossas armações aéreas no horizonte. Vãs. Esvaem-se ao calor que emana da terra verde (sim verde, porque não deixa a cor o Vale, agarra-se a ela).

Os olhos espicham-se no espaço do céu espaçoso e mais longe vão as lembranças e os pedidos. Esperamos. Agora nesse momento que escrevo o vento fresco bafeja a alma do mundo. Ou traz nuvens ou as afasta. Manhã veremos.

Recebam um abraço empoeirado, de Aureo Augusto.

6 comentários:

  1. 'Carma, a carma é essenciar pra arma'. Demora mas chove. Confiem em São Raul Seixas: "Se subiu tem que descer" (e ainda fala num tal de 'Nílton').
    Abraços chuvosos do semi-arido.

    ResponderExcluir
  2. Ei! Vc está me dizendo que está covendo no semi-árido? Esta é uma boa notícia. Viva!
    tá bom, vou ter carma.
    abç

    ResponderExcluir
  3. Salve, Dr. Áureo......há quanto tempo não visitas o teu blog...rsrrs

    Eu soube e vi o fogo comendo a Serra do Candombá e realmente é uma visão assustadora.

    Mas como diz o amigo acima: muita "carma" nesta hora e como rezar nunca é demais, vai aí uma reza das boas:

    "Santa Clara, clariou...São domingo anuviuou.


    Vem chuva....vai sol....pra molhar o meu lençol.

    (inverti as palavras...rsr)

    Receba um abraço molhado de uma chuva torrencial que está pra cair no Vale.

    Jussi

    ResponderExcluir
  4. OH! Jussi, que prazer "falar" contigo! recebo o abraço molhado com grande prazer.
    Realmente tenho colocado poucos posts no blog. Excesso de trabalho.
    Mas já tô ligado.

    ResponderExcluir
  5. Na região de Irecê tá começando a faltar água na torneira.

    http://www.correio24horas.com.br/noticias/detalhes/detalhes-1/artigo/seca-leva-106-municipios-a-decretar-estado-de-emergencia/

    Abç

    ResponderExcluir
  6. Esta noite aqui caiu uma neblina que deixou o capim molhado. Foi um refresco, embora mto pouco. Uma poeira de água.
    Soube que em Seabra, Andaraí e Mucugê a situação está bem feia, com perdas de safra.
    Tomara venha a chuva.
    Vc notou como o sol parece que está mais forte?

    ResponderExcluir