Wanessa preocupou-se e veio me procurar entre uma consulta e
outra. Ela é a agente administrativa do posto e também a recepcionista. Considero-a
uma funcionária exemplar e o que vou relatar fará vocês, leitores, concordar.
Foi uma situação corriqueira. Uma das nossas clientes que
apresentam um quadro de hipertensão e diabetes trouxe a receita para receber a
medicação da farmácia básica. Ela vem regularmente às consultas e tem o quadro
controlado, ou seja, está tudo bem. Mas Wanessa notou que na receita estava
receitada determinada medicação. Ela se lembrou de que aquela mulher tinha se
queixado de alguns sintomas desagradáveis com uma medicação para diabetes. Havia
passado mal e sofreu bastante. Então me mostrou o nome e considerou se não era
aquela medicação que fizera a cliente sofrer. Lembrei-me vagamente de que
realmente havia acontecido aquilo, mas achei pertinente que lesse o seu
prontuário. Enquanto eu ia atender outra pessoa Wanessa providenciou o
documento e me trouxe no intervalo seguinte. Então li com cuidado e vi que a
medicação havia sido mudada justo para aquela que ora ela pedia pelo fato de
que uma outra lhe havia feito mal. Wanessa saiu, então, satisfeita e dispensou
o remédio.
Quando ela saiu me deu uma sensação agradável por pertencer
à equipe de saúde da família da qual faço parte. Wanessa poderia sem mais nem
menos dispensar a medicação e pronto. Mas ela está sempre atenta aos possíveis
problemas que possam surgir e trata de cuidar para que eles não aconteçam. É uma
mão na roda.
O interessante é que nos arquivos do Ministério da Saúde a
agente administrativa não faz parte da equipe de saúde da família. Aliás, a
auxiliar de serviços gerais tampouco. Aqui em nosso posto, estas duas
funcionárias jogam papel essencial. Elas estão presentes em todas as reuniões
de equipe (que ocorrem invariavelmente às sextas) e participam efetivamente de
todas as discussões, planejamentos e decisões. Sem elas nosso posto não teria o
brilho que tem, tampouco a alegria de saber-se fazendo melhor dentro de nossas
possibilidades. A Estratégia de Saúde da Família é uma das coisas mais notáveis
que o Brasil criou na área da saúde, mas ainda tem alguns furos, como o de não
notar que o não reconhecimento destes funcionários como potenciais (ou ativos)
colaboradores na consecução de uma melhor saúde para a população. Uma pena.
Outra grande pena é pensar que Wanessa quando há poucos anos
atrás passou no concurso e assumiu o seu posto ganhava 1 salário mínimo e meio;
agora recebe 1 salário mínimo. É bonitinho ver os discursos dos políticos sobre
a saúde... Reconheço que aqui estou sendo irônico.
Gosto de estar nesta equipe, que apesar das enormes
dificuldades e injustiças que sofre, por conta da conjuntura sócio política e
econômica de nosso país, assim como pela mendicância moral daqueles que
controlam os postos de comando, dizia, gosto desta equipe, pois apesar de tudo,
mantém-se firme na labuta e, ademais, com alegria.
Recebam um abraço em equipe de Aureo Augusto.