Pensar nas dificuldades dos tempos pretéritos é algo recorrente
nas consultas no posto de saúde onde trabalho no Vale do Capão. Ocorre que
quando os idosos vêm à consulta eles sempre gostam de se estender um pouco mais
comentando do mundo e das coisas, inúmeras pertinências que fazem da minha vida
mais vivível, agradável.
Coisa bem frequente é rirmos do pessoal que se queixa do
Capão de agora, considerando-o excessivamente movimentado e confortável. Para
este grupo de pessoas Vale do Capão de verdade era o de antigamente, quando não
havia mais que 3 automóveis, vendinhas sem nada mais que fumo de rolo, cachaça,
bolachão mata-fome... Querem um lugar sem calçamento ou água encanada, sem luz
elétrica e sem o maior de todos os monstros da modernidade, a televisão.
O povo não se cansa de rir. Nem eu. Em geral as pessoas que
disso fazem apologia, dispõem de recursos financeiros para os casos de
problemas de saúde rapidamente se deslocarem para o sul do país onde logo são
atendidos, ou, quando cansam da vida “selvagem” partem para outras plagas com
outras ideologias.
Claro que alguns não são tão radicais e desejam mais repouso
para os cansaços citadinos. Porém, mesmo estes deveriam pensar um pouco mais,
pois pode ser romântico lavar pratos com folha de caiçara ou de embaúba e alvejar
roupa com folha de mamoeiro, mas é bem mais prático o uso do sabão (como me
disseram Beli, Dinha e Nadir). Das modernidades de antigamente, são poucas
aquelas que o povo idoso lamenta a ausência.
Estes dois últimos dias temos tido pouco movimento no posto.
É que amanhã começa um dos mais belos eventos do Capão, o FESTIVAL DE JAZZ. Aí todo
mundo está trabalhando para deixar tudo pronto para os inúmeros visitantes. Trabalho
para todos, dinheiro para todos, dignidade para todos. Sei que dignidade não se
compra, mas vocês entendem o que quero dizer. Quando aqui cheguei as pessoas
tinham vergonha de si. Hoje se sentem importantes na própria medida. Isso não
tem preço!
Recebam um abraço jazzístico de Aureo Augusto.
Que lindo, amigo Áureo. Quanta sensibilidade. Eu entendo o que dizes.
ResponderExcluirCações tb tinha estes "romantimos" dos antigamente mas eu estou muito feliz com os rumos do progresso pois ainda estão caminhando de mãos dadas com a preservação ambiental. E vê, os filhos e netos de nativos, se graduando, comprando seus carrinhos, tendo suas mordomias e confortos tb,me faz muito feliz.
Lembro de uma cumadi nativa, Raimunda, Mumum para os íntimos que tinha o sonho de ter uma mesinha de centro, na sua salinha simples. Nossa.
Abraços e dia 13 irei, com a minha família, lhe dar um grande abraço. Me aguarde....
veja que coisa: o sonho dela era ter uma mesinha de centro!!! Pode ser mto romântica a pobreza, mas só o é para quem não vive isso.
ExcluirBeijão
Lindos e atinados comentarios, Áureo!
ResponderExcluirOh! amigo velho,
Excluirlegal te encontrar por aqui.
abração