Já comentei que gosto de, nas sextas, fazer as visitas
domiciliares que a estratégia de saúde da família (da qual participa o posto
onde trabalho aqui no Vale do Capão) exige. Esse é o momento das pessoas
acamadas, idosas e outras com dificuldade de locomoção ser atendidas.
Recentemente tive a oportunidade de encontrar em uma dessas visitas a uma
pessoa pela qual tenho grande apreço, Seu Joãozinho que hoje conta 95 anos de
vida. Ele mora na rua do Lajedo. Mas hoje todos mencionam o lugar assim: “Vou
lá em Seu Joãozinho”, ou, “Eu moro em Seu Joãozinho”, isso mostrando a
referência que se tornou. Velho garimpeiro, uma pessoa bem especial. Nessa
visita deu-me de regalo uma pérola quando disse:
“Nunca
deitei carga em animá qui’eu não tivesse condição de levantá”.
A frase dá-nos ideia de seu senso de justiça; de sua
integridade, se tomamos esta palavra como a competência em manifestar-se ao
mundo com inteireza daquilo que crê, sente e faz. Uma vez que as sociedades
humanas têm sido fundamentadas em premissas muitas delas falsas, e sendo o ser
humano em muito fruto dessa sociedade não podemos esperar dele a perfeição. No
entanto é gratificante e renovador ver pessoas que têm um senso de justiça e
mesmo de solidariedade como o que estas palavras nos trazem.
Ensina-nos Comte-Sponville que solidariedade é a virtude que
nos faz contribuir com os demais a partir de um ponto de vista de que o fazemos
porque somos iguais aos demais. Ele compara isso com a bondade, que é a virtude
de quem tem mais e comparte, ou seja, onde não há a sensação de que há
igualdade. Quando o velho não sobrecarregava de peso o seu jumento, e, nessa
ação, usava-se a si como medida, ele entendia o valor intrínseco da vida e dos
seres vivos. O seu animal não era apenas um objeto destituído de significado
pessoal.
Erich Fromm, no seu belo livro A Arte de Amar, comenta que
“assim como a moderna produção em massa exige a padronização dos artigos,
também o processo social requer a padronização do homem e tal padronização é
chamada “igualdade”. O que eu temo é que estamos vivendo um mundo onde a
padronização nos poupe de encontrar pessoas como Seu Joãozinho, que seguramente
durante sua longa vida encontrou quem quisesse troçar de sua conduta solidária
para com um animal, e, de resto para com seus vizinhos, quem quisesse
ridicularizar sua honestidade e respeito, vendo nisso perda de oportunidades de
amealhar um pouco mais de recursos em um mundo e em um tempo duros que lhe
tocou viver.
Mas o fato de não se deixar levar por padrões sociais
restritivos (em termos de conduta solidária e honesta) de um tempo onde
prevalecia a lei do mais forte (foi época dos coronéis e da jagunçada aqui na
Chapada) que fez dele uma referência e um homem respeitado por aqueles que em
suas próprias vidas não seguiam os altos padrões morais que ele praticava.
Interessante o fato de que com frequência os embusteiros
costumam admirar, inda que não sigam, e mesmo respeitar, embora não cumpram,
àqueles que primam pela integridade.
Em 1/3/15 recebam um abraço joãozinhesco de Aureo Augusto.
Só ilustrando mas nem sei pq me veio à mente, o que eu vou relatar:
ResponderExcluirEstou em Cações desde de menina, nos longos veraneios ansiosamente aguardados durante o ano todo, para o desfrute na casa de meus tios. Uma promissa feita entre e mim e meu noivo, anosss atrás..rsrs, que, assim que tivessemos condições, comprariamos uma casinha de pescador aqui. E assim os Céus abençoaram e há exatos 26 anos temos o nosso querido cafofo.
Bem, quando a compramos, eu estava com 30 anos, muito nova para já ter um segundo lar e eu quase que nem assumia muito a minha condição de "dona de casa" mas sim, de "dona da casa". Então eram os meus pais que tomavam as rédeas e eu vinha de veranista. E como tudo no início são floreios, folguedos e usufruto de tempo aqui, painho e marido amavam pescar camarões, fartos na época. Era pesca de rede, de arrasto. E eu os acompanhava para alumiar com fifós, a pescaria. Só que, no arrastar da rede, vinham peixinhos, camarões pequenos e eu, me jogava a salvar os danadinhos enquanto painho, tadinho sem noção...rsrsr, reclamava comigo dizendo que os peixinhos iriam ser fritos e degustados. Marido também se retava com a minha conduta que atrapalhava a pescaria, afugentava os camarões e isso não durou nem um ano, quando resolveram abandonar a prática desgastante de uma pesca de rede (essa tipo de pesca é probida).
Seu Joãozinho, é muito fofo. Ele tem uma coisa que se chama empatia e mesmo com o jeguinho dele, ele se pôs no lugar do animal. Muito lindo. Muito carinhoso vindo e uma pessoa que alcançou os tempos brabos.
E que lindo, meu caro doutor, a oportunidade de cuidar dessa alma nobre, com suas mãos também nobres. Dr. Áureo, quanto experiências riquíssimas, hem? Isso nos salva o dia, isso nos salva o mundo.
Receba um abraço emocionado e por favor, quando ter com seu Joãozinho, diga-lhe que eu mandei um abraço carinhoso.
VIDA LONGA PARA SEU JOÃOZINHO.
REalmente é mto legal para mim poder fazer parte deste trabalho, encontrando pessoas como S. Joãozinho, um homem especial.
ResponderExcluirVida Longa Para Ele.