Quando cheguei aqui no Capão, há mais de 30 anos, havia dois
pássaros que se destacavam pela sua presença: coqui e anum. Hoje são raros.
Conversando com Dinha há pouco ela me alertou que estes pássaros são amigos das
culturas agrícolas. O Coqui sempre estava presente aonde a enxada tinha limpado
o terreno. E gostava muito de comer o arroz nas bagas, por isso de manhã cedo e
no entardecer o povo tinha que estar espantando o bichinho para não abater a
produção. Eu mesmo, naquele tempo plantei arroz de sequeiro e fiquei feliz com
a safra, mas tive que espantar a turma alada. Para mim o coqui e o anum são uma
espécie de corvos de nossa área, não apenas pela plumagem preta, mas também
pela capacidade de reproduzir palavras e o olhar penetrante e misterioso.
Dinha tinha um coqui. Ele era bem autoritário. Quando alguém
passava na frente da casa dele (Dinha pensava que a casa era dela) bicava a
cabeça da pessoa que era obrigada a estugar o passo. Para a vizinhança aquilo
era brincadeira, mas os turistas se assustavam. Quando eu estava fazendo algo
na enxada ele parece que adivinhava... chegava e observava aboletado em um
galho baixo. Então pulava no meu serviço pra comer e eu tinha que interromper o
trabalho. Tinha a sensação, quando ele me olhava desconfiado, que estava com
medo de eu ir comer sua comida.
Um dia desapareceu. Dinha acha que um turista o levou pra
si. Pena. Era gente boa!
Mas o fato é que alguns pássaros desapareceram na medida em
que a agricultura minguou. Anum, coqui, capitinga (chupa-capim), até o
tico-tico tem menos. Aumentou a Aranquã que antes era mais arisca, e o
periquito que ainda assalta o os poucos cafezais que restam.
Sinal da passagem do tempo por um Vale do Capão que, embora
tão guardado entre as serras, vê sua história mudada como nunca antes. Os jovens
não se interessam mais pela labuta na terra; preferem ser pedreiros ou mesmo
trabalhar com computadores... ainda temos alguns com o prazer de amanhar a
terra, mas não sabemos por quanto tempo.
Não lamento.
Há quem diga que o Capão era melhor antes – quem diz isso
não viveu aqui antes. Melhor ou pior, quem sabe? Sei que devemos estar prontos
para nos adaptar às mudanças, porque elas estão aí. Quem sabe as mudanças serão
tantas que até mesmo o coqui de Dinha volte para casa.
Recebam um abraço coqui de Aureo Augusto.
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