“Será que todo mundo vai ter câncer, pai, será que ninguém
vai morrer de velhice? ”. Foi a frase de minha filha, em tom de desabafo, ao
saber de mais um conhecido com a doença.
Conseguimos a glória duvidosa de criar um mundo completamente
novo e diferente daquilo que nossos antepassados nos fizeram herdar, com suas
frutas do quintal ou do quitandeiro, com suas viroses que faziam parte do
crescer esperado, com as línguas lambendo as mãos sujas de comida.... Roubar
frutas no vizinho era o padrão aqui no Vale do Capão, essa minha filha era
especialista. Agora a tendência é comprar o salgadinho na venda logo ali; refrigerantes,
calabresa e outros embutidos, antes raridades para momentos tão incomuns como
casamentos, hoje participam da mesa do dia-a-dia e as crianças, criadas com
esta alimentação, serão futuros diabéticos e hipertensos, obesos e com mais
chance de ter o Mal de Alzheimer, Mal de Parkinson e variados tipos de Câncer.
O açúcar era pras visitas, todos adoçavam com o não tão
comum mel ou a garapa da cana feita no quintal com uma traquineta artesanal.
Qual casa de hoje não se farta do açúcar tão danoso para o pâncreas, que também
irrita o corpo predispondo aos processos inflamatórios crônicos como as doenças
reumáticas, o câncer, depressão e outros males, isso sem falar que aumenta o
colesterol. Mas... pare um pouco! Na verdade, antes eu lutava para mostrar as
pessoas os males do açúcar, agora tem coisa pior: a frutose concentrada e
artificializada, retirada do milho produzido quase sem intervenção do solo tal
a quantidade de químicos na lavoura, frutose esta que é infinitamente pior que
o velho açúcar. É esta frutose que hoje se usa para adoçar os refrigerantes
porque é bem mais barata.
A par desta
alimentação doentia, e, em parte, como consequência desta, um consumo
desenfreado de medicações de todo tipo, receitadas ou não, mas sempre compradas,
usadas, ingeridas, quase como comida!
Mas não é só a comida! É também a sistemática de vida. Nos
livramos em grande parte dos ditames de uma religião institucionalizada e
anquilosada, bem como de uma moral hipócrita, para nos vermos perdidos num
saceiro de conceitos libertários, nem sempre responsáveis, e, em parte por
isso, incapazes de contribuir para um sentimento de segurança interior e de
pertencimento. Não olhamos mais os vizinhos como continuidades de nós mesmos, e
deixamos de lado o nosso ser social, fato esse acentuado em nossos corações
pelo doloroso procedimento doentio de boa parte dos políticos.
E me incluo. Amo o que faço, amo o lugar onde vivo, amo meus
amigos e amigas, amo muitas das coisas que configuram o meu existir aqui, no
entanto neste agora me dá uma de perguntar por que temos nós, eu incluso, que
criar em nós mesmos este afã de fazer. Não como luz e alegria e sim como um
cansaço de viver, uma obrigação imposta. E não adianta culpar a sociedade, a
economia, Deus ou o capitalismo, somos nós individualmente os maiores
responsáveis, pois demais vezes não nos permitimos o descanso, mesmo tendo a
oportunidade.
E, até a gente amada deste meu querido Vale, não tem mais
paciência para a doença ou para dizer às crianças o que e o como, cedendo a
elas direitos para os quais não ainda têm estrutura para suportar. E deixam de
lado o mato pelo celular, face, coisas assim boas quando não demais.
Olho a minha vida e vejo que são tantas as coisas deliciosas
a fazer, mas junto com elas e para que não se tornem um transtorno devo dar-me
o tempo do contemplar... como esse meu povo de antanho que sentava a conversar
nas postas depois do jantar.
Recebam um abraço pensativo de Aureo Augusto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário