Ela era uma jovem bela, com um sorriso situado entre a matreirice e a timidez, além de um corpo que inspirou muitos desejos na juventude daquele distante lugar onde vivia. Lá um dia se interessou por um rapaz o qual deixou a esposa, uma daquelas amélias, sempre dizendo sim, sempre aceitando todas as suas idéias e acompanhando o marido em todas os caminhos. Não se sabe se ela, a jovem bela, não a esposa (boa pessoa, mas um tanto sem graça) foi quem deu o passo na direção do rapaz ou se foi este quem insistiu para que algo acontecesse. Fato é que se juntaram e os destinos de ambos se atrelaram por um bom tempo. Até que se soube que o cara abandonou-a, reorientando sua vida para o caminho daquela esposa sempre obediente e pronta para retornar com ele no momento em que os azares da vida o fizeram ver nela de novo alguém a quem poderia olhar com aquele sentido de ser dois. Mas o que se conta, conquanto ao certo ninguém sabe o que de certo aconteceu, é que ela, vivendo com ele, olhou tentada por um vizinho o qual por sua vez já tinha dona. Contam que engravidou deste vizinho e por isso a coisa desandou e foi tal o desandar que dizia àqueles mais próximos que queria perder a criança e que isso de melhor era para todos. Mas o que contam, sem endereço certo, ou seja, sem que se saiba de testemunho presente, é coisa sem muita validade.
Certo mesmo é que o médico a viu em companhias bizarras bebendo farreando muito, coisa que sua religião, naquele distante lugar jamais iria perdoar. Notou ele que seu agir estava em franco desacordo com o que dela já conhecia. Certo também foi que um dia lhe correram a chamar, melhor dito, o rapaz aquele que havia largado e voltado à esposa veio busca-lo em sua casa lhe pedindo ir vê-la que estava mal. O médico colocou o sobretudo que o tempo pedia e acorreu a ver a mulher que sofria. Ali a examinou e a história dela dizia de muitas cólicas iniciadas tão logo engravidara de uma desejada criança. E nisso ia até que agora, após quase quatro meses, muito bem catalogados, eliminara com dor atroz uma coisa globosa e muito sangue. O exame ainda mostrou o útero grande e sinais de que o abortamento não fora completo e que haveria risco para a vida da mãe, havia que ir ao hospital. Ela mostrou-lhe lágrimas porque o pai, e citava o nome do rapaz que havia ido buscar o médico (e que não era o vizinho que tanto se falava por aí) estava bastante contente com a gravidez e com o filho e agora esta perda era triste – mas o médico sabia que o rapaz já estava instalado na casa com aquela que era a sua esposa antes abandonada e agora retomada – e olhava longe como para apaziguar a dor...
Enquanto retornava para casa, curvando-se em consonância com as árvores ao vento, pensava se ela não sabia que o rapaz já estava com a esposa, ou será que ela chorava porque sabia, mas confiava que este filho novo lhe garantiria sua fidelidade a si, e era, portanto, um investimento àquela altura frustro. Porém, a esposa abandonada ela também tinha filhos com o rapaz, filhos estes que nada garantiram para ela. Por outro lado, se ela tanto queria aquela criança, porque a vida desregrada que adotou sabendo-se grávida? Ela lhe negara peremptória qualquer ato abortivo. Mas será? Outrossim, pode ser que o rapaz, depois de algum tempo, enciumado ou não do vizinho, com razão ou não, olhou por si só (com ou sem motivo especial) para a sua ex-esposa, e nela viu algo que antes não lhe tocara, ou que notara nos tempos do namoro e agora renascera. Pode ser que ele tenha se arrependido e voltado, como uma pessoa que faz uma viagem e retorna para casa, ou acorda de um sonho. Só que neste caso, a viagem, o sonho, era outra pessoa que não aceitou e sofreu. Algumas mulheres por estes campos usam de engravidar e parir para segurar homens – coisa que nunca deu muito certo, mas enfim... – e ela, a bela jovem no desespero quis e quando mesmo assim ele se foi ela oscilou entre querer e não e ficou alternando entre o cuidado materno e uma vida alheia à sua até então. O médico pensou tudo isso e pensou também que não adiantaria perguntar, porque ela jamais falaria a verdade. Há algumas coisas que as pessoas preferem ocultar. E, negar verdades, é uma forma de impedir certezas. Nem sempre é possível encontrar o que realmente aconteceu de uma coisa, e, registre-se, não apenas porque os protagonistas deliberadamente mentem, mas também porque aqueles que participam de uma história, vivem-na conforme crêem ou da maneira como suportam. Cada fato na vida tem o seu significado, mas este significado é construído não apenas com o fato cru, mas com toda a carga pregressa de tudo o que aprendeu-se, identificou-se, desenhou-se para si.
Nem história, nem medicina são ciências exatas!
Em 21/5/10, quero que vocês recebam um abraço, Aureo Augusto.
"negar verdades é uma forma de impedir certezas"
ResponderExcluiracho que essa é uma das poucas veradades que o mundo inteiro tem certeza...
gosto muito do que você faz.
Caro, Dr Áureo.
ResponderExcluirBelo texto, como usual.
Eu sempre me emociono, quando escuto a seguinte frase: "O que DEUS uniu, que o Homem,não separe".
Claro que, quando este dileto rapaz casou-se com esta "amélia", ela tb cheirava a flor do campo e devia ser uma boa amante. É sempre assim. Com o passar dos tempos, ainda nos tempos atuais, muitas se anulam e se ver diante de um casamento morno. Morno é pior do que frio pq leva a acomodação e a falta de ação.
Aí, do nada, aparece a linda jovem, fresca, cheirosa, tal qual era a sua prenda, anos atrás. E o tresloucado "rapaz" que a essa altura, tb já deve aparentar ser pai da dita cuja, se arvoroça em aventuras deliciosas, proibitivas, movida por paixões desenfreadas e falta de dissernimento pois a maioria, nesta fase da vida, abandona tudo pela vagina fresquinha. Mal sabendo ele, que dificilmente isso dará certo, a não ser, por total incompatibilidade da federal (a sua esposa). E o que acontece? A pistoleira nova, trata logo de garantir a sobrevivência e os futuros bens, tão duramente conquistado pela federal, "botando barriga". E em muitos casos, tenta prender o macho por este caminho.
Mas geralmente quebram a cara. E bem feito.
Então, o tal rapaz, desfaz-se da pele do lobo e volta a ser o cordeirinho e pede, implora, para voltar ao lar. E geralmente consegue o feito. E devem passar noites e noites, lembrando das delícias que uma traição touxe para ele. E haja suspiros e gozos, talvez bem ao lado da esposa, que a esta altura deve dormir o sono das aliviadas.
Só que, também na maioria das vezes, estas amélias, podem ter dado o seu pulinho de cerca, nem que tenha sido em pensamentos. Talvez com o cunhado, o amigo do amigo do marido corno, o verdureiro, e muitas vezes, o médico.
O doutor, aonde ela vai medir a pressão ou se decidir pela colpoperineoplastia, achando ser este problemas, a grande culpa da sem vergonhice do marido infiel. Só escaparia o vigário, por que aí, seria pecado demais.
Enquanto isso, marido arrependido, dorme o sono dos justos.
Abraços!
É uma felicidade poder partilhar estas conversas. Tenho um problema com a internet aqui no Vale que é as vezes mto rápida e outras lerda que dá dó. Para mim é mto bom que ela exista e não me queixo de suas oscilações, mas isso me impede em alguns momentos postar ou responder. Outra dificuldade é que não sei como me comunicar diretamente com alguma pessoa que colocou algum comentário. Sou, nesse negócio de internet bem bocó.
ResponderExcluirSabe Jussiara, o rapaz é bem jovem. No caso dele não foi trocar uma de 40 por duas de 20. A esposa dele tb é jovem e bem apaixonada por ele; Penso que a questão foi outra. Esse negócio de sempre dizer sim, não é mto legal.
De outra forma Alice, se pensamos bem, mesmo que não se neguem verdades, às vezes nem assim temos certezas. Mas no caso desta jovem, sinceramente, penso que ela não quer que saibam o que realmente aconteceu. E, parece, coisas aconteceram que ela se sentiria mto mal fossem certezas gerais.
Um abraço,