Como todos os moradores do Vale do Capão, fui chamado a uma reunião com a Defensoria Pública, o IBAMA, um representante da prefeitura de Palmeiras etc. Cheguei ao local, e fui informado que haveria um pequeno atraso no início do encontro, por isso resolvi brincar de bola com alguns meninos. Entrei em um jogo repleto de regras. Era um gol somente, com um goleiro e 4 na linha; o goleiro lançava a bola, o primeiro que pegasse podia tocar quantas vezes quisesse na bola, os demais podiam tocar apenas uma vez. Uma vez que todos tocavam podia ser chutada a gol. Se o goleiro deixasse entrar três bolas estava mofado. Para ‘desmofar’ tinha que pegar uma das bolas. Se um jogador chutasse em gol, mas a bola fosse pra fora ele iria para o gol, da mesma forma que ocorria quando o goleiro pegava o chute. Mas se fosse de cabeça e não entrasse não precisava ir pro arco. Estas eram apenas algumas das regras e não pude deixar de pensar que as crianças realmente gostam de regulamentação. Pode parecer que não, quando protestam no momento em que os adultos lhes negam alguma vontade. Mas a realidade é que estão ansiosas por encontrar limite. Talvez porque limites definem e elas estão aprendendo a definir-se. Nós, adultos, também, esta é a verdade. Como era de se esperar me dei mal porque esquecia com freqüência alguma regra (e às vezes me impingiam alguma nova lei que, tenho certeza, não me haviam contado) e ia castigado para o gol. Mas estava tão entretido na brincadeira que não percebi quando começou a reunião. Por isso acabei me atrasando um pouco. Felizmente começou o encontro com a leitura de um documento que já havia lido de modo que pouco perdi.
Logo no início da reunião percebi que o tema era semelhante ao que havia experimentado durante o jogo de bola uma vez que o assunto era o conjunto de leis que regem a vida em uma comunidade como a nossa, nas proximidades de uma floresta com remanescente de mata atlântica, encravada, cercada pelo Parque Nacional da Chapada Diamantina no norte, leste e oeste ficando apenas o sul liberado. Por isso somos uma APA, ou Área de Proteção Ambiental. Daí que não podemos fazer o que quisermos das terras que nos foram adjudicadas por compra ou herança. Ocorre que há alguns anos foi efetivado o PRUA, plano criado e aprovado pela câmara de vereadores com a finalidade de reger o uso da terra por aqui. Este plano nunca foi respeitado, mas agora, principalmente se consideramos que o Vale do Capão tem atraído a atenção de um número cada vez maior de pessoas, muitas delas querendo não apenas visitar, mas também se instalar aqui, no que não as critico, já que é arriscado vir por estas bandas porque é fácil não querer mais sair.
As autoridades presentes souberam apresentar o assunto com compreensão, mostrando que estavam no dilema de multar-nos a todos pelos nossos erros, em sua mor parte involuntários, ou re-adequar aquilo que no passado havia sido decidido. Por exemplo, em nossa área, qual o tamanho de terrenos que podem ser vendidos? Se muito pequenos o que será do Capão em pouco tempo? Se muito grandes, como poderia uma pessoa aqui nascida vender um pedaço de terra para implementar algum negócio que lhe facultasse a sobrevivência? Como continuar as atividades agrícolas se há um sem número de restrições impostas pela legislação. Como as crianças do jogo de bola, fomos convidados a elaborar um conjunto de regras para este jogo que é morar nesta localidade, regras estas que nos comprometeremos a seguir.
E nisso não há nada que seja estranho à nossa existência, pois viver é limitar-se. Submeter-se às leis ou à sistemática da existência é algo indiscutível. Não podemos fugir do fato de que temos que comer, dormir, exercitar-nos, relacionarmo-nos uns com os outros, respirar, cumprir determinadas solicitações da sociedade etc. Bem fazem as crianças com seus jogos/treinos que os capacitam a interagir com as limitações que o ato de existir nos impõe.
Este texto foi escrito há muito tempo, em 17/10/05, e a realidade é que o PRUA ainda não é obedecido de rigor, mas chegamos lá (assim espero).
Recebam um abraço,
Aureo Augusto
legal a suas regras eu vou dar una ex: para você. um so os numeros de regras 1 2 3 4 5 6 7 8 9 etc..
ResponderExcluirAss: Emanuela carooooooooooooooooo
nao tenho
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