quinta-feira, 14 de novembro de 2013

VANDA (que não é Vanda) E A MUDANÇA DO CLIMA

Vanda não se chama Vanda de batismo. Seu nome é Evani... Quando era pequena seu pai chamou-a Vanda e pegou. Isso é coisa comum. Dentro da minha família eu sempre fui Gusto, meu irmão Carlos Aníbal, ficou Nick (porque Milinha – que era Palmira Emília – assim dispôs), a mais velha, Maria José, sempre foi Marizé; só Dionísio ficou Dionísio e nada mais.
No Vale do Capão tem alguns casos bem interessantes. Um dia atendi Célia, ela me deu o nome dela como Célia, porque é Célia que todos assim a chamam. Algum tempo depois a atendi no posto e aqui, nas regiões da oficialidade governamental, as coisas são com carteira de identidade, a identidade é a da carteira, então Célia ficou Sebastiana. Temos outra Sebastiana que é Neuza. Não sei bem o que Célia e Neuza têm a ver com Sebastiana, mas, como se diz vox populi vox Dei. Não discuto.
Mas dizia de Vanda. Não era de nomes que queria tratar e sim do que me disse no almoço. Ela faz a comida deliciosa que como todos os dias e depois rimos um do outro na hora da refeição (e rimos também com e dos hóspedes e vice-versa). Comentava que quando era criança e adolescente trabalhava muito na casa dos pais. Ela gostava de determinados dias quando tinha que lavar a roupa e botava a bacia na cabeça com todos os panos da casa e caminhava quilômetros até a beira do rio onde lavava tudo. Era bom, me disse, porque tinha muita água. Hoje o rio está seco.

Era bom, porque tinha muita água. Hoje o rio está seco.
Estas palavras são, para mim, atordoantes. Assustadoras mesmo. Estou acostumado a ver na televisão os documentários sobre as modificações que a Terra vem passando no passo lento do tempo. Milhares de anos e o gelo retirou-se vagarosamente do Hemisfério Norte, liberando um mundo que estava mermando sob o peso cristalino do frio. Milhares, milhões – são números geológicos. Gostava de me refestelar no conforto do tempo contado em milhões ou bilhões. Não me dá a mínima segurança saber que um caudaloso rio há uma ou duas dezenas de anos atrás hoje é um caminho onde minguam o pasto e os animais e nas margens do qual as pessoas ruminam lembranças da infância.

Moro no Vale do Capão há 30 anos e vejo que o mundo mudou e, pelo menos climaticamente não foi para melhor. Neste momento a seca assola a Bahia e o Nordeste. A pior dos últimos 60 anos. Depois teremos um período mais ameno, mas menos chuvoso do que o ameno anterior. Aqui no Capão o tempo está claro, claro demais, pois que o sol faz as folhas minguarem antes do seu tempo. Claro porque as nuvens não beijam o solo com suas gotas de frescor. Tão claro como pode ser triste o pensamento de que o mundo, ou pelo menos este mundo está se desertificando. Muitos córregos que antes eram perenes, hoje jazem desaparecidos no matorral. E com eles somem certos bichinhos que fizeram ali uma casa úmida e agradável. E olhe que o Vale do Capão é um oásis por assim dizer nessa região. Temo que o oásis metafórico se torne geográfico rápido demais.

Gosto de limo e de musgo. Agrada-me o frescor da água corrente e dos recantos úmidos deste pedaço do paraíso. Temo que o mundo esteja mudando não pelos milhões e sim pelas dezenas e até pelas unidades de tempo. Às vezes sinto que as coisas de alguma forma dirão a todos nós suas verdades e que nós escutaremos, já em outros momentos fico apreensivo.


Recebam um beijo úmido no coração, Aureo Augusto.

8 comentários:

  1. Não se afobe, Áureo, as mudanças são lentas, graduais e efetivas, e sempre aconteceram,
    nós é que às vezes as percebemos e outras vezes não. Não houve um tempo em que o mundo todo
    esfriou? Assim se formaram geleiras. Talvez estejamos numa época em tudo deve se aquecer.
    Desesperar? Não adianta, os ciclos se sucedem do mesmo modo.
    Abraço geológico.

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    1. grato TEsco,
      mas não sei não, acho que tem coisa rápida demais!

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  2. Sábias palavras de um homem que, ao notar determinadas mudanças, não fica sentado aguardando pelo que virá. Caso pareça-lhe possível interferir e participar do processo de transformação, inspirando corações e mentes das pessoas com as quais convive, ele fará. Não vejo alguém a se desesperar com essas palavras, mas vejo sim, alguém que não está disposto a esperar. Vejo a esperança de uma pessoa que, como tantas outras, já se deram conta do seu papel na construção de uma outra forma de se relacionar social e ambientalmente. Forte abraço e gratidão pelo compartilhar de inspirações...

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    1. eu é quem agradeço por suas palavras. Olho aqui da janela o céu absurdamente azul. Lindo azul, mas reconheço algo de absurdo no fato de que estamos vivendo a pior seca nos últimos 60 anos. Dizem que é fenômeno recorrente. OK. Mas o desmatamento ao redor das nascentes maximiza o efeito da seca. Todos nós temos alguma responsabilidade.
      abraço.

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  3. Meu caro doutor Áureo, eu te entendo. E como entendo. Eu também sinto estas angústias. Sou virginiana, elemento terra e bem sei das mazelas que a Mãe Natureza está sofrendo. E é complicante.

    Por essas e outras, que eu vibro de feliz, ao precisar usar meu cobertor de lãzinha aqui em Cações, em quase verão. Sim, eu durmo de cobertor ainda mesmo o inverno já ter se ido embora. Mas a região, acinturada pelas matas ainda nativas, cheia de nascentes e o próprio mar, favorece este clima delicioso. Eu sempre digo que eu tenho uma casa reversível: da praia para as montanhas.

    Mas me preocupo e muito. Na minha linda e histórica terra nativa, Nazaré das Farinhas, o rio que outrora eu brincava, tomava banho, andava de canoa, morreu. Isso mesmo; Morreuuuu.....virou um pasto, sei lá. Me corta o coração...

    Entendo tu.

    Receba uma braço cheio de orvalho.

    Abraços.

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    1. Horrível, não é? Acredito que nós todos precisamos atentar para cada atitude e nelas ver o que piora ou melhora as coisas e tentar mudar.
      bjs

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  4. Caro Dr. Áureo, moro em Irecê, numa fazenda e já passei por muitas secas mas esta é a pior de todas. Vejo a caatinga se acabando e o sol inclemente a matar quase tudo.Aqui eu não tenho gado, ainda bem, pois vi rebanhos dizimados. Fico apreensiva, mas eu ainda acredito nos homens. Que Deus abençoe o nosso sertão, e todo Nordeste brasileiro.

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  5. Dizem que estas secas são sazonais e que respondem a condições globais naturais, mas o pior é que o desmatamento (inclusive perto das nascentes) segue. Aí fica mais difícil para o ambiente resistir à seca.
    A cobertura vegetal é uma proteção.
    Também sigo acreditando.
    bjs

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