segunda-feira, 17 de agosto de 2009

UMA ESQUIZOFRENIA BRASILEIRA

Há pouco postei um texto (v. É Ferro) onde comentava a postura de uma mulher, ou melhor, de uma comunidade de Palmeiras com relação ao atendimento médico. Disse de sua dependência às medicações e como reparei que naquela localidade as pessoas são ansiosas e tristes. Ontem (sábado, 15/8/09) fui a pizaria La Piedra aqui no Vale do Capão com um amigo pelo qual tenho muito carinho, o Dr. Ricardo, que também é médico. Enquanto saboreávamos uma deliciosa Marguerita integral, ele comentou sua estupefação diante do que encontrava em comunidades camponesas nas áreas onde atua (também trabalha em PSF). Disse que as pessoas já chegam na consulta dizendo que ali está para que o médico receite tal ou qual medicação (um cara com dor muscular exigiu uma Benzetacil) e esse ou aquele exame (“tou com uma dor aqui na cabeça e quero um raio X”). Ricardo disse que quando ele mostra para as pessoas que naquele caso não está indicado a medicação pedida, as pessoas se enervam. Ele está estarrecido com a quantidade de pessoas neuróticas no meio rural. Muitas pessoas são usuárias de medicações “tarja preta” e perderam a noção de perigo com relação ao uso de medicações. Acontece que os médicos que freqüentaram antes dele a área, obedeciam aos pacientes em um processo de inversão de atitudes impressionante. Enquanto em muitos lugares os médicos exercem autoritariamente sua autoridade, ali, na realidade por desprezo à população assistida (uma postura do tipo: quero me livrar), faziam o que esta mesma população pede. Não se deram ao trabalho de conversar, explicar, exercer o papel pedagógico que em muita medida a medicina pede. Claro que fica difícil conversar quando se tem trinta ou mais pessoas para atender, mas daí à irresponsabilidade que é abdicar seu papel de orientador das pessoas que sofrem... Comentei com Ricardo que o PSF é um programa maravilhoso, onde se exige que o médico lance mão de ações educativas, mas o mesmo governo que quer isso do médico, só leva em consideração, na hora de avaliar um posto, o número de atendimentos. Trata-se de um equívoco espantoso. Não é o número de doentes atendidos que mostram a saúde da população e sim o número de pessoas que não adoeceram.
Obviamente temos pessoas doentes e estas devem ser atendidas, porém se o sistema pede ações preventivas e educativas, estas têm que ser consideradas como ponto capital. Todos sabem que a educação é essencial para a saúde e um exemplo disso é o estudo dos pesquisadores do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Mário Jorge Cardoso de Mendonça e Ronaldo Seroa da Motta, apresentaram no final de 2005; um estudo onde fazem uma avaliação das melhores formas de reduzir a mortalidade infantil (uma das metas do milênio) e chegaram à conclusão que “a pesquisa mostra que a redução do analfabetismo das mulheres é a maneira mais barata de combater a mortalidade infantil”. E Márcia Fuquim de Almeida, professora de epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da U. F. de São Paulo (USP) afirma: “A educação é o meio mais abrangente de combate à mortalidade infantil porque age em todas as componentes do problema”. Já sabemos disso, porque fingimos que não sabemos?
O Brasil precisa sair da postura esquizofrênica quando trata dos seus problemas: Por um lado ainda mantém o antigo paternalismo autoritarista, tratando o povo como crianças tuteladas e por outro investindo na construção de uma sociedade onde as pessoas comuns participam ativamente da governança. O nosso país joga nos dois times, como se fosse possível a um jogador de futebol atuar nas duas equipes ao mesmo tempo. Ou queremos uma sociedade adulta e responsável ou criaremos um país de dependentes, como se o governo fosse papai e mamãe. Resta saber se o SUS terá condições financeiras de suportar ser papai e mamãe.
Um abraço para todos vocês.
Em 16/8/09.

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