sexta-feira, 29 de julho de 2011

O BOM e o BELO

“Nenhum retrato exprime perfeitamente
os segredos da alma, pois esta última
ao mesmo tempo se esconde e
se revela nas dobras da pele”
Roberto Romano.

Apaixonei-me por Auguste Renoir desde a primeira vez em que vi uma foto de um de seus quadros. Há uma vaporosidade neles, e uma felicidade etérea que muito me atraem. Há um, intitulado Nu Feminino à Luz do Sol, pintado entre 1875 e 1876 que me causa forte impacto. Não me atrai o rosto da figura, porém a pele, com seu róseo, seus verdes (verdes na pele?), com o seu revelar/esconder alma (usando a expressão de R. Romano) é um tratado de dermatologia e beleza. Um crítico da época pede a Renoir que não confunda a pele de uma mulher com “carne podre com manchas vermelhas e violetas”. Seus olhos eram incapazes de ver que as cores das coisas não são apenas as cores próprias, mas também os reflexos daquilo que está ao redor. Um grande passo dos impressionistas foi notar isso. A jovem que ele retratou tinha manchas de sol, assim como reflexos do verde brilhante das folhas e sombras violetas belíssimas e o seu conjunto falava da beleza e da saúde da pele da mulher.
Vários filósofos gregos colocaram o conceito da proximidade, senão identidade do bom e do belo (kalokagathia). Falta-me competência para discutir isso, porém tomo a liberdade de trazer esta idéia para a nossa cosmética. É de vital importância o reconhecimento de que a pele esconde/revela o nosso estado do corpo, assim como o da alma e, se aqui identificamos, por razões didáticas, alma com psique, ou com inconsciente, podemos aproveitar a frase de Reich, que dizia: “Se você quer tocar no inconsciente do seu paciente, toque no seu corpo”, lembrando que tocar no corpo é antes de tudo tocar na pele. O precursor da bioenergética nos lembra que corpo e alma são uma só coisa. Por isso, a cosmética que freqüentemente dedica-se a esconder reais, subjetivos ou imaginários defeitos, e a dermatologia que trata dos cuidados quanto à saúde da pele (e cosmética e dermatologia se aproximam muito) são convidadas pela realidade a mergulhar além do subcutâneo, atuando não apenas na superfície, mas também reconhecendo que a pele é fruto da necessidade interna de interação com o mundo. Sendo a fronteira de nosso ser corpo com o universo, é o ponto de encontro entre as necessidades e potencialidades internas com aquilo de limitante que nos traz o mundo. Fiquemos no estado do corpo.
O nosso organismo mostra suas necessidades através do estado da pele, assim como se revela saudável graças a ela. As deficiências nutricionais apresentam-se com muita freqüência como problemas de pele. A vitamina B1 é essencial para o bom funcionamento deste órgão. Deficiência de vitamina A também a altera e por aí vai. Por outro lado, alimentos gordurosos, frituras etc. tendem a fazer com que a cútis fique feia. Por isso a coisa do bom e belo. O bom funcionamento dos órgãos internos repercute na beleza da pele. E há que reiterar que alimentação é fundamental. Se não cuidamos de nosso ser (físico, psíquico, espiritual) continuamos praticando uma cosmética voltada para esconder os males reais sem virtualmente resolvê-los.
Recebam um abraço bom e belo de Aureo Augusto.

3 comentários:

  1. Excelente artigo Dr. Áureo. Só uma pessoa como você para nos remeter a Renoir e extrair da sua pintura lições de vida, de nutrição e de saúde. Felicidades.

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  2. Não entendo de cosmética, como frisei na crônica "Dicas de maquiagem", no tescoaqui em setembro de 2010. Quem quiser conferir, pode ir ao blog Arquivo, é o quinto post.
    De dermatologia também não entendo, pois não tem essa disciplina nas Geociências.
    Mas a tela de Renoir é bonita e não se pode atingir a alma, descurando-se o corpo e, consequentemente, a pele.
    Embora não sejam a mesma coisa, contrariando Reich, estão imbricados, um é caminho do outro.
    ("Ninguém vai ao Pai senão por mim"?).
    E como o corpo é reflexo da alma, também a pele reflete o organismo que envolve.
    Mais uma vez a sensibilidade de Áureo explora muito bem essa relação.
    Abraço praiano.

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  3. Grato pelos comentários, realmente, Ana, não é necessário ser dermatologista e inclusive nem precisamos ser entendidos em arte para amar Renoir. Uma única vez tive a graça de ver-lhe uma tela, no MAM em São Paulo, e chorei. Foi Rosa e Azul. O rosto da criança menor é algo, é algo... não tenho palavras.
    Tesco, não consegui entrar no blog que vc indica. Fiquei curioso. Vc tem razão qto ao imbricamento. A frase "um é o caminho do outro", é completa.
    abração

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