quarta-feira, 24 de setembro de 2014

POBREZA E SAÚDE

Assisti a um documentário sobre a alimentação na Grécia, onde aprendi que um pesquisador resolveu, na década de 50 do século passado, avaliar a saúde e a alimentação de diversos povos e surpreendeu-se que a paupérrima gente que habitava a ilha de Creta, no sul da Grécia era a mais saudável, com grande número de pessoas centenárias e baixa incidência de doenças cardíacas. Ali, a alimentação era constituída de grande quantidade de legumes e verduras encontradas no mato, ou plantadas por aqueles que as consumiam, com muito azeite de oliva e pouca carne (que quase sempre era peixe poucas vezes na semana). Eles não tinham condição de comer outras coisas. E exatamente isso, esta pobreza, foi o que lhes protegeu o coração e, de resto, toda a sua saúde.

O assunto me tocou porque neste momento tenho conversado com as mulheres idosas que participam comigo de um grupo de atividade física e conversas as quartas, 7 da manhã, no posto de saúde da família onde trabalho. Elas me trouxeram amostras das plantas que colhiam no mato ou plantavam para consumo nos tempos aqueles em que o Vale do Capão vivia sob a noite do abandono. Quando os homens mais capazes se foram para terras distantes buscando sobrevivência para si e para os seus.
Extensos estudos modernos feitos pelas Universidades gregas mostram que o quadro se reverteu naquele país. A riqueza lhes fez gordos (sua juventude é a mais obesa da Europa) e doentes, acometidos que foram pelos males da viciante comida fast food. Um povo inteiro é o fruto desta experiência maldosa e lucrativa que é propor uma dieta sem ética, focada na argumentação econômica do lucro. O Vale do Capão, no passado, não tinha uma alimentação tão saudável quanto aquela dos gregos, mas tinha diversas coisas que eram maravilhosas, como a Capeba, Maria Gondó e Quiabinho. Plantas que estavam no prato no almoço e no jantar e que sustentavam a força dos antigos em um mundo muito mais duro do que o atual.

Hoje, por conta da crise econômica na Europa, os gregos estão voltando a considerar com novos olhos a comida de seus avós. Tomara nós, aqui no Vale, na Bahia e no Brasil não precisemos de tal crise.

Ensina-nos Gilberto Freire que o vigor dos escravos vinha do fato de que sua alimentação era mais rústica e rica do que aquela dos senhores, eles mesmos escravos dos quindins que com tanto gosto degustavam. Gosto de saber que aqui se comia palmito de jaca, caroço de jaca cozido, beldroega, capeba e por aí vai. Quando publicarmos o modesto fruto de nossas conversas das quartas, tomara na escola os professores e estudantes possam ver a tragédia que a nossa civilização, tão maravilhosa em outras instâncias, reservou para si na alimentação. Criando o triste paradoxo da saúde na pobreza (e escravidão) e da doença na riqueza.


Recebam um abraço pobre e saudável de Aureo Augusto.

domingo, 21 de setembro de 2014

CONTENTAMENTO

Somos muito bobos, sou
Quando olhando a bondade da vida
Nos sentimos sós, ou tristes;
Há uma tristeza na vida é verdade
Mas não da natureza dos nossos receios;
Volto a ela.

Somos tolos quando deixamos
Por nossas pequenas dores decorrentes
Dos nossos grandes/pequenos desejos
Quando, repito, olvidamos ali do outro lado da janela
O sol oblíquo sobre o silêncio eloquente das árvores;
Vamos a elas.

A vida nos toca sem que percebamos os milagres
Do mero existir da pedra, agulha ou mão no teclado
De pé sobre o abismo da existência onde nossas almas
Se abismam, bestificadas da enormidade do ser,
Deixamo-nos deixar que cada uma das coisas
Do dia-a-dia nos mortifique nas cadeias do vir-a-ser;
Deixemo-las.

Volto à tristeza radical que nos ata à essencialidade
De que somos inda que não saibamos o quanto, onde e para que,
Como se necessariamente houvesse que assim ser
Amo a esta lembrança como parte de nossa natureza comum, somos;
Assumamo-lo.

Vamos às árvores, e não só a elas, ao mundo
Deixemos que nos toque com suas mãos de terra, água e ar
Com o fogo abrasador ao que o senso nos convida
Apenas para reacender a tristeza primordial que nos incita à vida;
Abracemo-la.

Abracemos à vida, esta fugaz luz feita da eternidade fugidia das estrelas
Muito acima daquilo que reveste-se da importância parda
Das fantasias vestidas com roupas glamorosas
Que nos atraem delicadas e fortes a sua órbita alienantemente vital
Mas com a pessoalidade daquilo que não nos forma, afinal.
Em seu exato lugar coloquemo-la.

Deitou-se enfim o sol (ou a Terra completou sua órbita)
E o pálido reflexo do fim da tarde nas folhas me diz
Que o mundo mais uma vez busca os lençóis desde já
Enquanto os humanos insistem em suas pequenas nobrezas
Sim, aqui estou só e em paz e penso em um par de olhos
Perguntando-me coisas que ninguém responderá
Apenas porque nós, seres humanos, somos uma pergunta
Lançada à eternidade:
Respondamo-la.

                Vale do Capão, entardecer de 21/9/14.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

REFRIGERANTE E DEPRESSÃO

Essa é curta, curta:

Algumas pesquisas feitas com número restrito de pessoas mostraram que há uma certa relação entre o consumo de REFRIGERANTES e DEPRESSÃO. Em janeiro/13 o Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos divulgou estudo onde acompanharam 264mil pessoas (uma tropa de gente) que mostra que quem bebeu mais de 4 latinhas por dia tem 22% mais de possibilidade de desenvolver depressão. O REFRIGERANTE DIET É PIOR (aqui sobre pra 30%).


Ô pessoal, suco é um pouco mais caro, mas a longo prazo sai mais barato e melhor pra saúde.

Pais e mães, não dêem refrigerantes para seus filhos.


Beijos doces (sem açúcar nem aspartame e coisas que tais) a todos.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

FESTANÇA DOS TEMPOS ANTIGOS

O trabalho com as idosas na semana passada foi mais divertido ainda do que o comum dos dias. Após a ginástica, desafiei-as a me contar coisas da festa do padroeiro, São Sebastião, nos tempos antigos. Elas se entusiasmaram!

Contaram que quando chegava perto da festa, em janeiro, elas, as mulheres – pois era uma atividade feminina – pegavam aquele cabo onde, no cacho de banana ficam presas as pencas. Então cortavam um pedaço, depois batiam com um macete ou martelo até criar um pincel. Então iam atrás de tabatinga (que chamam aqui de tubatinga) em um buraco perto do Riacho do Ouro. Ali colhiam pedaços e depois pilavam até fazer pó que misturavam com água. Então pintavam as paredes das casas. Assim ficava tudo bonito, com cara de novo.

Surpreenderam-me com a informação que por aquela época, a festa em si, do padroeiro começava no sábado e só terminava na segunda-feira, dançando o tempo todo. Para a dança ficar bem legal, os pisos das casas eram preparados com terra, jogavam então cinza por cima e pilavam com força até que ficava como se fosse um cimento. Mesmo assim rolava poeira, então interrompiam um pouco, jogavam água e recomeçavam o forró.

Com a melhoria da vida, ou seja, com o retorno temporário ou não, de algumas pessoas que haviam ido morar em São Paulo, o Capão ficou mais civilizado (palavra delas) e apareceram as vitrolas movidas a pilhas. Disseram que juntava “todo mundo” para comprar as pilhas. Então era dançar até a pilha acabar. Mas aí já tinham água fervendo. Colocavam as pilhas na “frevura” e deixavam cozinhar um pouco. Então dava pra usar por mais um bom tempo! Não souberam me dizer de onde aprenderam esta fórmula.

O fato é que a turma de antigamente se divertia muito com o pouco que tinham; com o quase nada que alcançavam sacavam um mundaréu de alegria.


Recebam um abraço festivo de Aureo Augusto em 3/9/14.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

O LUGAR DA PARTEIRA

A parteira é uma pessoa muito respeitada em sua comunidade e aqui no Vale do Capão não é diferente. Regra geral a mulher que cuida da parturiente durante a labuta para o nascimento da criança tradicionalmente é alguém que faz parte de uma família cujas mulheres se acostumaram a esta tarefa. Em outros casos foi por instinto, noutros porque calhou estar ali na hora certa. Tem mulheres que obviamente têm o dom.

Aqui temos Nara que vem de uma linhagem de parteiras e que tem feito partos algumas vezes; já Araci e Marilza, não têm linhagem e tampouco são parteiras, mas vejo que ambas têm o dom, apenas não o assumem. D. Aurea, que já está bem velhinha e por isso afastando-se da atividade, começou porque aconteceu de estar na hora certa no lugar do nascimento. Da turma nova, temos Natália e Mariane que são enfermeiras obstetras que está recebendo o título de enfermeira obstetra agora. Este é outro grupo, o das parteiras por idealismo e amor, as quais querem levar para a mulher confortos da ciência associados às práticas ancestrais de acolhimento e protagonismo. O Capão, como veem, está bem servido. Aqui ainda contamos com doulas (Lívia e Juliana) o que é algo especial.

Todas as parteiras, independente do que e do como se inseriram nesta atividade, têm em comum um sentido de missão e é por isso que a comunidade as exalta. Tive a oportunidade de experimentar isso.

Há quase 30 anos fui chamado para auxiliar uma mulher num parto. Foi o primeiro que acompanhei por aqui. À época morava em Lothlorien e Dinha, a parturiente, tinha sua residência logo depois da ponte de Almir (que é o marido dela), indo pro Bomba. O parto foi muito legal, com direito após tudo terminado, a um gostoso caldo de cana que foi feito em uma máquina manual construída com troncos de madeira que a família movia na força do braço.

Naquele tempo não havia feira aqui no Capão e no sábado todos desciam até Palmeiras para vender e comprar. Eu também. Então, em um destes sábados dei com Dinha na feira. Ela me viu e me deu um abraço que me impressionou pela sua peculiaridade. As mulheres daqui eram bastante reservadas. Lembro que uma vez Nivaldo durante um forró entregou-me sua esposa para que eu dançasse com ela. Esta era uma atitude que mostrava publicamente grande confiança e consideração (ela, que estava tensa demais e por isso dançou com dificuldade, pareceu-me que não gostou de tanta consideração naquela hora). Enfim, as mulheres não eram dadas a maiores aberturas com os homens que não fossem maridos, irmãos, ou enfim, parentes próximos – e veja lá. Mas Dinha me abraçou com uma alegria e abertura inusuais. As mulheres ao redor também se aproximaram e me trataram com uma intimidade que até então nunca havia ocorrido e olhe que já morava aqui havia cerca de 5 anos!


Só então me dei conta que havia acompanhado um parto e assim entrava para o grupo das parteiras. Ponho no feminino porque naquele momento com aquelas mulheres, conversando e dando risada, me senti como se eu não fosse um homem (embora tampouco fosse uma mulher), ocupando um limbo destinado a seres relativos à magia do parto. Gostei!

Recebam um abraço parteiral de Aureo Augusto

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

DULCE

Sempre gostei muito da presença das mulheres da vizinhança durante os partos que fiz aqui no Vale do Capão. Porém agora me lembro de uma pessoa que era extraordinária. Recordo-me de Dulce. 

Este não era o seu nome, mas ninguém se referia a ela pelo batismo e sim pelo apelido que revelava-lhe a doce alma.
Ela tinha olhos verdes, claros, cristalinos e sorriso bondoso. Mas era firme e brincalhona. Quando eu chegava nas casas para parto ou atendimento médico ela já lá estava. E me informava: “já pus água para ferver”. Caso fosse parto, tinha o chá de algodoeiro em andamento. Como conhecia, pelo observar, muitos dos meus tratamentos hidroterapêuticos, cuidava de ter panos para as compressas...

Parece que havia um acordo tácito entre os vizinhos que fazia com que a considerassem parte de qualquer cuidado em saúde. Eu, de minha parte, estranhava quando ela não estiva ali. Dulce era parte íntima do cuidado.

Impressionava pelo bom humor, embora tenha tido uma vida matrimonial dura, já que seu esposo era homem difícil, adicto ao álcool que o tornava mais difícil ainda. Há quase 30 anos soube que ela havia enviuvado. A ponte dos Brancos sobre o rio que serpenteia por todo o Vale do Capão havia caído quando de uma enchente e ele, bêbado, caiu do cavalo na passagem difícil pelo vau, batendo a cabeça e foi encontrado morto.

Daí para a morte dela se passaram em torno de 15 anos, quando tive a oportunidade de conviver (pelo menos nos momentos de atendimentos) com sua disponibilidade bondosa. Desenvolveu um tumor cerebral e foi tratar-se em Salvador. Eu estava trabalhando no quintal de casa quando me procurou um de seus filhos, Gilmar. Ele entrou devagar me olhou, disse que sua mãe tinha morrido e retirou-se incontinenti. Fiquei parado... Como seriam os atendimentos a partir de agora?

Recebam um beijo saudoso de Aureo Augusto.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

RODILHA DA CALÇA DO MARIDO

Frequentemente os costumes populares vêm da relação do ser humano com a natureza, ou de acontecimentos antigos nas sociedades. Um exemplo é a capoeira que, todos sabem, é uma dança e uma luta que se desenvolveu como uma forma de defesa. A gravata que até algum tempo atrás era adereço masculino obrigatório foi adotada pelos franceses quando foram apoiados por tropas sérvias no século XIX que usavam lenços no pescoço. Os franceses adotaram, modificaram e logo foram imitados pelo resto do mundo.

Mas tem alguns costumes que nos provocam interrogação. Uma vez fui fazer um parto lá no Bomba (a parte mais ao sul do Vale do Capão, antes chamada de Coruja – o povo não gostava deste nome e mudou – já perto da subida dos Gerais). O processo demorou um pouco e a mulher acabou ficando cansada. Mas, embora demorado, estava dentro da normalidade, afinal cada mulher e seu bebê tem seu ritmo. Estava aguardando quando D. Maria, parteira que também estava comigo, procurou uma calça do pai da criança. Fiquei curioso. O marido da parturiente trouxe uma calça, mas estava limpa, recém-retirada da gaveta. Não servia. Tinha que ser usada, não precisava ser imunda, mas usada.
Quando o rapaz trouxe a calça, a parteira fez uma rodilha e pôs sob a mulher que estava de cócoras. Para ela isso acelerava o parto.

Continuei esperando e matutando sobre qual a causa ou qual o simbolismo naquela atitude. Depois de muito pensar ocorreu-me que, conquanto durante a dilatação a mulher fique bastante introspectiva e até mesmo abstraída do mundo, o processo de expulsão marca um retorno ao mundo, a uma conduta mais ativa, já que uma vez que a criança nasce a mãe deverá estar bem atenta a possíveis problemas para a criança. Quando vivíamos nas matas, este era um momento frágil e os predadores poderiam se aproveitar. Talvez intuitivamente se faça uma associação entre esta conduta mais, digamos, agressiva, e a calça do marido que pode simbolizar a força ativa, a adrenalina que chega neste momento. Claro que esta minha elucubração pode ser pura viagem, oxalá os leitores me tragam explicações melhores.

Em tempo: O parto aconteceu na boa, mas não vi nenhum aumento do pique com o uso calça do marido.

Aureo Augusto.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

HORIZONTALIDADE

Partilho com vocês um poema que fiz em abril deste ano:
            HORIZONTALIDADE
A vida tem todas as possibilidades de grandes glórias e aventuras
E elas, as possibilidades, aí estão espreitando-me;
Alegra ao meu coração aventureiro poder flertar com elas
E saborear em alguns momentos coisas afins com a conquista
Com descobertas de novos mundos e alegrias feitas de fantasia.

Então, quando os meus membros se cansam de aplaudir as ilusões
E quando as pálpebras e as sobrancelhas se exaurem do assombro
Olho para o oco em meus pés, o pó entre os dedos sujos
Sinto aquela agradável sensação de cansaço na panturrilha
Depois de uma caminhada bem longa, voltando do trabalho.

Quando chego em casa ao anoitecer acompanhando o espichar-se das sombras
Conheço o sabor do ar penetrando olorosamente os recônditos de meu cérebro
Dizendo-me onde isso ou aquilo, cada coisa, distribuindo-se no meu pequeno mundo
Em que cada suspiro e riso, cada piscar ou rir, enfim nada está em nenhum lugar
Habitado pelas potestades celestes, glórias extraordinárias ou epítomes de prazer.

Sento-me diante da lareira apagada (se não faz frio);
Naquele lugar os momentos de percepções geniais
São uma alegria tão grande quanto o sabor comum do meu dia
Ou como as costas sentindo o tronco da árvore no repouso.

recebam um abraço horizontal de Aureo Augusto.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

ANDAR NA ROMARIA E FORA DELA

Quando se aproxima a data da festa da Lapa, começa a arrumação do povo para a romaria. Hoje a maior parte vai de ônibus especialmente fretado para isso. Juntam o dinheiro e procuram os motoristas que já criaram um esquema muito bem arrumado para o transporte dos fiéis (têm até carteirinha de chefes de romaria). Há algum tempo eram caminhões com as pessoas amontoadas na carroceria, parando aqui e ali para comer, descomer e dormir. Mais antigamente ainda era bem mais pitoresco e cansativo. O povo do Vale do Capão se preparava com cuidado, porque a viagem duraria mais de um mês. Saíam a pé, homens, mulheres e crianças, com suas coisas na cabeça ou no lombo de animais e caminhavam léguas e léguas até chegar ao seu destino. Era uma verdadeira epopeia, que não deixava a dever ao Caminho de Santiago do qual tanto se fala.

Embora exaustiva, acredito que esta caminhada representava para eles um momento onde eram esquecidos todos os aspectos opressivos do cotidiano. A gente aqui era pobre, muito pobre. Quem garimpava recebia o ‘saco’ (uma espécie de cesta muito básica) do sócio e partia para a serra para cavoucar a terra em busca de cascalho promissor. Depois o trabalho cansativo de manusear o calumbé e as peneiras até, se a sorte e a intuição resultassem, vir o brilhante reluzir. As mulheres ficavam cuidando da terra e da criançada. Uma vida dura! Quando decaiu a lavra e o café deixou de trazer rendimentos seguros restou à maioria dos homens partir para São Paulo, de onde mandavam dinheiro para o sustento da família, ou desapareciam para sempre sem dar notícias. Vai daí que mais de um mês experimentando o nomadismo deveria representar um descanso; um interregno de sonho, onde tudo pode ser bem aproveitado aos sentidos porque nada será para sempre. Nenhuma rotina!

Descanso caminhando! Sair da rotina era algo maravilhoso, mas as pessoas daquela época talvez não notassem o quanto era benéfico o fato de ter que caminhar aquela jornada.
Observo que em lugares do interior as pessoas fortes, lutadoras, como todas as demais, adoecem, mas não tanto. Mas quando chega a idade e param, quando deixam os exercícios obrigados da labuta, logo se enchem de achaques. Aqueles que, por diversas situações, não podem parar, adoecem menos. Ficando claro que tudo demais é sobra. Ou seja, alguns se esfalfam tanto no trabalho que terminam adoecendo por isso.

O ser humano, se não foi feito para trabalhar em excesso, com certeza não o foi também para ficar parado. E somos uma gente construída para caminhar, e muito. E isso começou com nossos mais remotos antepassados. Foi um sucesso quando cientistas descobriram pegadas de Australopitecus afarensis, na região chamada Corno da África. As marcas eram evidências de que aquele ser caminhava ereto. Como nós. Aliás, não paramos mais. Tanto é assim que logo seus descendentes, os H. erectus e H. habilis, se dispersaram por toda a África, Europa e Ásia e, em seu devido tempo o H. sapiens alcançou a América povoando-a do estreito de Bering à Terra do Fogo. E tudo isso a pé.

Em certa medida gostamos de desculpas, proteção e conforto. Porém desculpas frequentemente são formas de impedir que vivamos de verdade a verdade que é viver. Proteção, coisa tão útil para o nosso crescimento e mesmo para a manutenção da nossa vida, quando em excesso nos será prejudicial. Conforto, quem não o quer? Demais, porém, é um dos mais poderosos venenos. Portanto, caminhemos como fizeram nossos antepassados.

Recebam um abraço caminheiro de Aureo Augusto.