As vezes as pessoas se admiram do quanto eu gosto deste povo do Vale do Capão. Ocorre que este é um lugar pequeno, quando cheguei aqui não tinha este caráter, diria, cosmopolita, que tem hoje. As dificuldades eram muitas, e supera-las aproximava. Quando caminho pelo Vale, hoje em dia, noto que já entrei em praticamente todas as casas para atender a algum doente que não podia se locomover (hoje tem tanta casa nova que aos poucos esta constatação perde validade). No passado, os vizinhos, ou melhor, as vizinhas de mais idade, muitas vezes formaram equipes para ajudar este ou aquele enfermo que não contava com famílias, pois todos os familiares haviam emigrado para São Paulo ou Goiás, ou para ajudar uma parturiente – momentos inesquecíveis onde a noite revelava a história e os causos de um passado mais duro ainda. As festas eram simples, os forrós eram momentos únicos para a diversão e a briga, o retorno sazonal de parentes era festejado com fogos de artifício. Há poucos dias, escutei o espocar de fogos e não soube o que era. Depois vim a saber que um jovem havia retornado após longo período de hospitalização. Sua avó de pura felicidade tocou os fogos. Quando fui visitá-lo ele me disse que não sabia o que deu na avó. É que pertence a outra época. Aqui se soltavam fogos pela ocasião da festa do padroeiro, no nascimento das crianças (isso ainda se faz) e no retorno dos familiares emigrados, nas poucas visitas. Para aquela senhora, a volta do neto querido era como o advento do padroeiro, o (re)nascimento do ente querido, o retorno do emigrado.
As vezes caminho no retorno para casa após um dia de trabalho e me delicio com a amizade que recebo em cada uma das palavras que me é dirigida. Há um entrelaçamento de parentesco embora este não exista! Os lugares pequenos obrigam a uma relação bastante próxima. Isso pode trazer alguns desconfortos. Por alguma arte de uma comunicação secreta as vidas são um tanto permeáveis a observação, o que não significa que segredos não existam; existem e as vezes são terríveis – há até segredos compartilhados por toda a comunidade, causam certa revolta, porém aí estão mantidos secretos, espinhos. Como se certas coisas não pudessem ser evitadas. Outrossim um secreto e comum sentimento de pertencimento conforta as almas.
Devo dizer que com a chegada de muitos imigrantes, um pouco disso se perde. Formam-se grupos que desestabilizam o ambiente “parental” que até agora existiu. No entanto, observando outras localidades e comparando com a capacidade assimilativa deste vale, penso que em algum tempo os recém-chegados experimentarão o mesmo que eu: serão absorvidos. Como isso depende do volume de imigrantes e da natureza dos mesmos, pode ser que nem todos venham a vivenciar isso, é verdade. Mas, lembro-me que mesmo nos tempos remotos sempre tinham algumas pessoas que de alguma maneira estavam a parte. Toda família extensa tem alguém que está perto mas não se aproxima.
Em 25/7/09 receba um abraço com o ruído da chuva que agora começou a brincar com o telhado.
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